O desenvolvimento econômico é muitas vezes explicado como decorrência de fatores associados a sistemas políticos, recursos naturais, educação, entre outros. Porém, no decorrer da evolução histórica, alguns estudiosos apontam a religião como um fator de grande influência para economias inteiras.
O primeiro a desenvolver um estudo ligado ao tema religião e economia foi o sociólogo alemão Marx Weber (The Protestant Ethic and the Spirit of Capitalism, 1905). Onde identificou o que chamou de "ética econômica das religiões universais", considerando cinco religiões: o confucionismo, o hinduísmo, o budismo, o cristianismo e o islamismo. Para Weber não se trata de expor a teologia moral dessas religiões, mas de entender os encadeamentos psicológicos e pragmáticos que exerceram um papel importante nas motivações praticas das atividades econômicas. Essa relação entre o conteúdo das religiões e o desenvolvimento econômico de uma sociedade são muitas vezes indiretas, visto que acaba sofrendo a influência de outras instituições existentes nessa mesma sociedade. Weber explicou que cada religião possuía uma implicação na conduta econômica das pessoas, essas implicações divergiam em particular na forma de apresentação da “doutrina da salvação”, a qual as religiões faziam seus adeptos a acreditar.
Do ponto de vista dos reflexos sobre as práticas econômicas, o alemão diferenciava basicamente dois grupos: o que separa as religiões que valorizam a ação no mundo diário (Ex.: protestantismo), e os que tem uma atitude negativa para com este mundo e estimulam a indiferença ou distanciamento para com ele (Ex.: budismo).
São poucos os estudos modernos para este assunto, onde é difícil quantificar algo como as crenças religiosas ou comparar as estatísticas sobre elas entre os países. Porém, uma pesquisa realizada pelo Instituto Gallup em 114 países (2009), mostrou que o grau de religiosidade de uma sociedade tem grande impacto na economia da mesma. No estudo foi possível concluir que para os países mais pobres do mundo, com renda per capita de US$ 2.000 ou menor, a proporção da amostra que considera ser a religião importante em suas vidas diárias é de 95%. Já para os países ricos, com renda per capita superior a US$ 25.000, é de 47%.
Tabela 01: Importância da Religião na Vida Diária, segundo grupos de renda.
Gallup (2009). Elaboração Observatório Econômico Sindifiscal/MS.
As práticas religiosas causam trade-off, onde tempo e recursos que poderiam ser gastos com produção econômica estariam sendo direcionados para causas religiosas, trabalhos nos templos, participação em cultos, peregrinações, etc. Na visão da Sociologia, diz-se que é a pobreza que facilita a expansão da religião, não seria a religião que determinaria a penúria de um país, mas a penúria de um país que favoreceria a expansão dos núcleos religiosos.
Nota-se que uma religião pode afetar diretamente o que seus seguidores recebem. Por exemplo, nos Estados Unidos fundamentalistas e evangélicos tendem a ter taxas de poupança menores do que membros de outras religiões, visto que possuem maiores famílias e fazem maiores contribuições financeiras para suas igreja.
No Brasil, a religião predominante e com o maior poder de influência na economia é o Catolicismo, contudo a religião vem perdendo força. Sua decadência é observada desde os primeiros dados censitários (1872), exacerbada nos anos 90.
Fonte: CPS/FGV a partir do processamento de dados publicados e micro dados do IBGE. Elaboração Observatório Econômico Sindifiscal/MS.
Apesar do declínio do catolicismo, a religiosidade não esteve em baixa no Brasil. Todas as outras religiões pesquisadas apresentaram aumento na última década, assim como os que se consideram sem religião.
Fonte: CPS/FGV a partir do processamento de dados publicados e micro dados do IBGE. Elaboração Observatório Econômico Sindifiscal/MS.
A forte ligação entre o espírito empresarial e as organizações religiosas seria uma marca desses organismos emergentes hoje no Brasil. O contexto de estagnação econômica das chamadas décadas perdidas (1980 e 1990) teria facilitado a busca de novas modalidades de realização pessoal e inserção produtiva (não remunerada, filantrópica), para lidar com as dificuldades materiais percebidas em meio a crescentes taxas de desemprego e de precarização do trabalho. A demanda por novas opções religiosas é associada a choques econômicos e sociais adversos, assim é possível compreender o fenômeno da emergência de grupos pentecostais e dos sem religião pelo aspecto teratológico do mesmo.
Em Mato Grosso do Sul, a população sem religião passou de 165.792 (ano 2000) para 225.784 (ano 2010), segundo o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Na mesma base de comparação, houve um incremento de 37,22% no Produto Interno Bruto per capita do estado, passando de R$ 12,95 mil (ano 2000) para R$ 17,77 mil (ano 2010). Em ato contínuo a tese weberiana, a correlação observada aponta para outra linha de pesquisa, proposta por Barros e McCleary (Religion and Political Economy in an International Panel, 2002) - redução da religiosidade ante o crescimento econômico.
Em 2002, o estudo realizado por Robert Barro e sua esposa Rachel McCleary mostrou que a religião imprime um efeito mensurável sobre as economias em desenvolvimento. A pesquisa analisou os efeitos da relação entre a doutrina da salvação e os reflexos na economia, sob a ótica de cada uma das quatro maiores religiões no mundo (Cristianismo, Hinduismo, Islamismo e Budismo). Após a análise da doutrina de cada uma, o casal chegou a duas conclusões: 1) As quatro acreditam que a riqueza é algo positivo e a pobreza negativo, e com isso todas estimulam o crescimento econômico; 2) Sob a tese do maniqueísmo religioso, as que enfatizam a crença da existência do inferno acabam incentivando aspectos que estimulam o crescimento econômico; enquanto as religiões que enfatizam a crença no céu e minimizam a abordagem do inferno contribuem menos para a economia.
Por outro lado, o mesmo estudo demonstrou que quanto maior a frequência às igrejas o crescimento econômico tende a ser menor, pois as pessoas irão alocar mais de seu tempo a tarefas religiosas e menos a tarefas econômicas. Barro e MacCleary expõem suas ideias da seguinte maneira:
“Apesar de a religiosidade tender a se reduzir com o desenvolvimento econômico, a forma como isso se dá depende das dimensões do desenvolvimento econômico. Por exemplo, a religiosidade esta positivamente relacionada com o nível de educação e negativamente relacionada com o nível de urbanização. O aumento da expectativa de vida e a redução na fertilidade são aspectos que se relacionam inversamente com o nível de frequência as igrejas, mas não parece ter associação nenhuma com o nível de crença religiosa” (Barro & MacCleary, 2002, p.40)
Tabela 02: Evolução do percentual de urbanização e de pessoas sem religião
Fonte: Censo Demográfico (IBGE). Elaboração Observatório Econômico Sindifiscal/MS.
Como conclusão da pesquisa, na medida em que a renda de uma sociedade aumenta a religiosidade diminui, porém a afirmação não é definitiva devido a outras variáveis de difícil mensuração. A análise mostrou que o crescimento econômico está positivamente correlacionado com as crenças religiosas, especialmente as referentes à doutrinação do céu e inferno, mas negativamente à frequência à igreja.
Nota-se então que a religião é um dos muitos fatores que afetam diretamente as atividades econômicas. No entanto é difícil estudar o impacto da religião nas variáveis macroeconômicas, dado a dificuldade em afirmar o que causa o quê. Isto é, o crescimento econômico altera a religiosidade ou são as práticas religiosas que têm um efeito no crescimento econômico.
Vídeo explicativo de como a religião se espalhou em torno do mundo:
Referências:
BARRO, Robert J.; MCCLEARY, Rachel M. Religion and political economy in an international panel. National Bureau of Economic Research, 2002.
Censo Demográfico IBGE – 1890, 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991, 2000.
CORREIA, Ronaldo Zandoná. Reflexões sobre economia e religião: seus principais pensadores e a Igreja Católica brasileira. 2003. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo.
CRABTREE, Steve. Religiosity Highest in Word’s Poorest Nations. 2009. Disponível em: <http://www.gallup.com/poll/142727/religiosity-highest-world-poorest-nations.aspx>. Acesso em 28 de julho de 2016.
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WEBER, Max. The Protestant Ethic and the Spirit of Capitalism, 1905. Disponível em:http://www.d.umn.edu/cla/faculty/jhamlin/1095/The%20Protestant%20Ethic%20and%20the%20Spirit%20of%20Capitalism.pdf
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